16 abril 2009

He who forgets, will be destined to remember...

Pearl Jam, Nothingman

Lobbies

Há-os em todo o lado, eu sei. São transversais a todas as esferas da sociedade, em todas as actividades económicas de um país, em todas as relações no mundo. Mas há um lobby que sempre me irritou solenemente. Não sei porquê, não me perguntem porquê. Talvez porque mexa com aquilo que é mais essencial na vida de um ser humano – a sua saúde. Vai daí essas notícias que me têm chegado sobre a guerrinha entre médicos e Associação Nacional de Farmácias andam a fazer-me espécie.

Primeiro vem a ANF dizer que autoriza os farmacêuticos a trocarem os medicamentos prescritos pelos médicos por um genérico, mesmo que lá não venha o avisozinho de que tal substituição está autorizada. Depois vem a Ordem dos Médicos, lá do alto da sua sabedoria de senhores doutores, donos e guardiões de um negócio elitista e bem muralhado, como é o da saúde dizer: “Eh lá! Mas que vem a ser isto? Alguém a desautorizar-nos?? Mas ainda continuamos no reino de quem é senhor doutor é santo e adorado!”. E fazem o quê? Acusam a ANF de estar a servir os seus próprios interesses porque agora vai começar a produzir genéricos…

Ora o senhor João Cordeiro, presidente da ANF, ressentido com tal infame acusação (que está bem longe da verdade, porque a ANF é na realidade a versão bata branca do Robin dos Bosques), vem dizer – espante-se! – que os médicos favorecem certos laboratórios farmacêuticos e que será por isso que não substituem os medicamentos de marca pelos genéricos. O senhor da Ordem, pois claro está, fica fulo da vida perante a insinuação, de que os médicos, quais salvadores da pátria, não viajam para todo o mundo às custas das grandes companhias farmacêuticas onde vão brincar às conferências. Credo! Maldito daquele que pensa que os médicos não jantam em mesas fartas com delegados de propaganda médica, em troca sabe-se lá bem do quê… Enfim, só fala quem tem que se lhe diga. E já se sabe o que é que acontece quando se atira pedras para o telhado do vizinho…

E faço minhas, as suas palavras...

Quimicamente puros

2009-04-14

É um dos mitos mais generalizados o de que os jornalistas, como os anjos, não têm sexo, que é como quem diz vida pessoal, relações, interesses. Toda a gente sabe que não é assim, mas trata-se de uma convenção que os jornalistas permanentemente alimentam e sobre que o jornalismo, enquanto profissão, constrói de si mesmo, para si e para o mundo exterior, a ideia especular de um nicho quimicamente puro de "isenção" e "independência" pairando acima da sociedade. É nessa ideia que o jornalismo funda a legitimidade de que se reclama de vigilante e juiz da sociedade.

Quando um jornalista se mostra como sendo, afinal, humano ou tendo motivos e interesses, e se atreve - em vez de os ocultar, como manda o código de aparências corporativas - a falar sem exibir publicamente "distância" e "isenção", viola regras não escritas e desencadeia reacções automáticas de exclusão. O que aconteceu recentemente com uma jornalista do DN e o mal-estar que gerou por ter deixado "contaminar" a sua opinião (opinião, sublinhe-se) pela sua alegada vida pessoal é um bom exemplo da hipocrisia de que se alimenta o jornalismo.

Manuel António Pina, in JN

08 abril 2009

Velha Chica

Antigamente a velha Chica
vendia cola e gengibre
e lá pela tarde ela lavava
a roupa do patrão importante;

e nós os miúdos lá da escola
perguntávamos à vóvó Chica
qual era a razão daquela pobreza,
daquele nosso sofrimento.
Xé menino, não fala política,
não fala política, não fala política.

Mas a velha Chica embrulhada nos pensamentos,
ela sabia, mas não dizia a razão daquele sofrimento.
Xé menino, não fala política,
não fala política, não fala política.

E o tempo passou
e a velha Chica, só mais velha ficou.
Ela somente fez uma kubata com tecto de zinco, com tecto de zinco...!
Xé menino, não fala política, não fala política.

Mas quem vê agora o rosto daquela senhora,
daquela senhora,só vê as rugas do sofrimento, do sofrimento, do sofrimento!
Xé menino, não fala política,
não fala política, não fala política.

E ela agora só diz:“- Xé menino, quando eu morrer,
quero ver Angola viver em paz!
Xé menino, quando morrer, quero ver Angola e o Mundo em paz!”

Dulce Pontes e Waldemar Bastos

*Numa destas minhas complicadas noites de insónias, o radiozinho de cabeceira voltou a ser a minha companhia. Naquele crepúsculo entre o sono e a consciência, ouvi esta música e não pude deixar de voltar a tomar daqueles "sedativos naturais" que trazem um sono profundo.